Gabriel Fortes
Em um importante passo para a promoção da representatividade e equidade de gênero nas escolas brasileiras, a Lei 14.986/2024 foi sancionada no dia 25 de setembro, pelo vice-presidente da República, Geraldo Alckmin, no exercício da presidência. A nova legislação altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB, Lei nº 9.394/1996) e introduz a obrigatoriedade de abordagens fundamentadas nas experiências e perspectivas femininas nos currículos do ensino fundamental e médio. Além disso, institui a Semana de Valorização de Mulheres que Fizeram História, a ser realizada anualmente nas escolas de educação básica, na segunda semana de março.
O objetivo principal da lei é garantir que as contribuições, vivências e conquistas femininas, tanto no Brasil quanto no mundo, sejam devidamente incluídas nos currículos escolares. Com isso, diversos aspectos da história, ciência, artes e cultura passarão a ser ensinados a partir de uma perspectiva que valoriza a contribuição das mulheres em várias áreas, como científica, social, artística, econômica e política.
Essa mudança, que entrará em vigor em 2025, representa mais do que uma simples inclusão de conteúdos. Ela se insere em um movimento maior de promoção de equidade e justiça no ambiente escolar, estabelecendo um caminho para o reconhecimento e valorização das diversas contribuições das mulheres para a sociedade.
Representatividade e Equidade nas Escolas Brasileiras
A criação de leis que promovem a representatividade de grupos historicamente marginalizados é uma ferramenta essencial para a promoção da equidade no Brasil. A inclusão das experiências femininas nos currículos escolares está em consonância com outros marcos legais que, ao longo dos anos, têm buscado garantir a representatividade e representatividade e diversidade nas políticas públicas. Um exemplo disso são as Leis nº 10.639/2003 e nº 11.645/2008, que tornaram obrigatória a inclusão do ensino de História e Cultura Afro-Brasileira, Africana e Indígena nos currículos escolares.
Essas leis não apenas corrigem a omissão histórica de grupos socialmente marginalizados, mas também ampliam o olhar das novas gerações sobre as contribuições de pessoas e grupos à construção da sociedade brasileira. No contexto das mulheres, a nova legislação segue o mesmo caminho, ao evidenciar a importância de incluir perspectivas femininas na educação como um passo para garantir uma visão mais completa.
Equidade Além das Oportunidades: Representatividade e Inspiração
A equidade educacional não se resume apenas em oferecer mais oportunidades para meninas e meninos, mas também envolve a criação de um ambiente em que todas as crianças possam ver a si mesmas representadas nas figuras de inspiração e sucesso que estudam. Isso está de acordo com estudos que indicam que a representatividade de grupos minoritários na educação pode melhorar os resultados acadêmicos dos e das estudantes. A presença de professores e professoras pertencentes a grupos minoritários, por exemplo, pode aumentar as expectativas educacionais e o senso de conexão escolar entre estudantes das mesmas minorias (Atkins et al., 2014). Além disso, a inclusão de representações precisas e diversificadas de minorias nos livros e demais materiais didáticos permite que os estudantes formem conexões mais profundas e compreensões mais amplas (Giarrizzo, 2012).
A nova Lei 14.986/2024, ao incluir experiências e contribuições femininas nos currículos, propõe que a educação não apenas prepare os estudantes para um futuro mais justo, mas também busca fornecer exemplos concretos de que as meninas, assim como meninos, podem se destacar em qualquer área — seja na ciência, nas artes ou na política. A representatividade, portanto, se torna um fator-chave para transformar a visão que meninos e meninas têm sobre suas próprias potencialidades, criando um ambiente mais inclusivo e inspirador para todos.
Pesquisas como a de Kogan et al. (2021) também mostram que a maior representação de minorias nos conselhos escolares da Califórnia levou a ganhos significativos de desempenho para os estudantes minoritários, ao mesmo tempo em que aumentou o investimento em infraestrutura e a proporção de diretores não brancos, sem comprometer o desempenho dos estudantes brancos. Esses resultados sugerem que a representatividade não só melhora os resultados de grupos historicamente marginalizados, como também beneficia o ambiente escolar como um todo.
No contexto brasileiro, estudos como o de Sousa e Salustiano (2022) apontam que os professores reconhecem a importância de abordar a diversidade no currículo das escolas e indicam a necessidade de respaldo legal dando suporte para que esse trabalho seja desenvolvido. O respaldo legal é fundamental para que os professores sintam-se resguardados no desenvolvimento de práticas educativas sobre a diversidade na escola.
Por fim, a educação para a diversidade tem o potencial de promover o crescimento econômico e o desenvolvimento social, além de reduzir conflitos (Smith, 2006). Para alcançar esses benefícios, é essencial promover mudanças no currículo, na seleção de materiais didáticos, bem como nas políticas de seleção, formação inicial e continuada. Investir na representatividade em vários aspectos da educação pode, assim, levar a melhores resultados para a comunidade escolar criando uma base mais sólida para uma sociedade equitativa e próspera.
Consequências Práticas da Nova Lei no Campo Pedagógico
Do ponto de vista pedagógico, a implementação dessa lei demandará mudanças significativas nas atividades escolares. Professores de diversas disciplinas, como história, artes, ciências e literatura, precisarão adaptar seus planejamentos para incluir figuras femininas e suas realizações em suas aulas. A Semana de Valorização de Mulheres que Fizeram História também incentivará a realização de projetos e atividades que destaquem figuras femininas em vários campos do saber, promovendo debates, exposições, e pesquisas voltadas a destacar o impacto das mulheres ao longo da história.
Essas mudanças podem gerar reflexões mais profundas sobre questões de gênero e contribuir para a construção de uma sociedade mais igualitária, além de inspirar meninas a buscar carreiras em áreas tradicionalmente dominadas por homens. Essa lei pode ter um impacto particularmente importante sobre a relação das meninas com as áreas de ciências da natureza, matemática e tecnologia, muitas vezes tidas como masculinas e pouco inclusivas para as meninas do ensino fundamental e médio.
Um Marco para a Educação Brasileira
A sanção da Lei 14.986/2024 representa um marco significativo na educação brasileira. Ao garantir que as experiências e contribuições das mulheres sejam ensinadas nas escolas, a lei reafirma o compromisso com a equidade de gênero e com a construção de um ambiente educacional mais inclusivo para todas as pessoas. Trata-se de uma oportunidade para corrigir desequilíbrios históricos e inspirar futuras gerações, promovendo uma educação que valoriza a diversidade e prepara meninos e meninas para uma sociedade mais justa e equitativa.
Essa mudança curricular, assim como as leis que promovem a inclusão das culturas Afro-Brasileira e Indígena, reforça que a equidade não se limita a corrigir desigualdades econômicas, mas também passa por proporcionar às novas gerações a chance de verem a si mesmas nos exemplos que constroem a história, ciência e cultura do Brasil.
Referências
ATKINS, D. N.; FERTIG, A. R.; WILKINS, V. M. Connectedness and expectations: How minority teachers can improve educational outcomes for minority students. Public Management Review, v. 16, n. 4, p. 503-526, 2014.
BRASIL. Lei nº 14.986, de 25 de setembro de 2024. Altera a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), para incluir a obrigatoriedade de abordagens fundamentadas nas experiências e nas perspectivas femininas nos conteúdos curriculares do ensino fundamental e médio; e institui a Semana de Valorização de Mulheres que Fizeram História no âmbito das escolas de educação básica do País. 2024.
GIARRIZZO, T. History losing its value: Representation of minorities within high school history texts. 2012.
KOGAN, V.; LAVERTU, S.; PESKOWITZ, Z. How does minority political representation affect school district administration and student outcomes? American Journal of Political Science, v. 65, n. 3, p. 699-716, 2021.
SMITH, A. Education for diversity: Investing in systemic change through curriculum, textbooks, and teachers. In: ROBERTS-SCHWEITZER, Eluned; GREANEY, Vincent (Ed.). Promoting Social Cohesion through Education: Case Studies and Tools for Using Textbooks. p. 29-46, 2006.SOUSA, M. A. A.; SALUSTIANO, D. A. Diversidade no currículo escolar: perspectivas de professoras da educação básica. Revista Teias, v. 23, n. 68, jan./mar. 2022.
Equidade garante que cada aluno tem condições reais de aprender, e representatividade assegura que todos se vejam reconhecidos e respeitados no ambiente escolar.
A inclusão das experiências femininas no currículo representa um avanço importante para a promoção da equidade e da diversidade na educação. Essa mudança na LDB reconhece o papel histórico e social das mulheres, permitindo que meninas e meninos tenham contato com diferentes perspectivas e referências femininas ao longo da formação escolar. Além disso, valorizar essas narrativas contribui para desconstruir estereótipos de gênero e formar cidadãos mais críticos e conscientes sobre as desigualdades ainda presentes na sociedade.
Concordo com você Lilian. Em uma sociedade que apesar de todas lutas femininas para uma igualdade de gênero, ainda vivemos uma cultura de padrões considerados próprios para meninos ou meninas, que ainda causam prejuizos significativos na escolha de profissões específicas ou mesmo no sonho romantico da princesa que necessita de suporte masculino para desenvolver-se.
Não tivemos Semana da Mulher na escola em que trabalho em 2025. Agora que tomei conhecimento da lei, irei buscar sua realização em 2026.
Sempre trabalhamos projetos ligados a valorização feminina e Arte e Projeto de Vida.
Muito bom e fácil de intender