Nos últimos anos, o Brasil tem feito esforços para melhorar a qualidade da educação básica. O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), aferido regularmente pelo Ministério da Educação (MEC), se tornou um dos principais indicadores desse progresso. No entanto, além do avanço no desempenho escolar, uma questão fundamental ainda precisa ser analisada: a relação entre o aumento do IDEB e a redução das desigualdades raciais.
Esse foi o objetivo de uma pesquisa realizada no Observatório de Equidade Educacional (NEES/UFAL), conduzida pelos pesquisadores Rodrigo Lins (UFRPE) e Gabriel Fortes (Universidad Alberto Hurtado – Chile). Eles analisaram a relação entre o aumento do IDEB e a redução das desigualdades raciais no Brasil, identificando se os avanços na qualidade da educação básica estão sendo acompanhados por maior equidade racial, além de avaliar o impacto das políticas educacionais voltadas à promoção da justiça social no ambiente escolar.
Análises preliminares desse estudo indicam que, em diversos Estados e municípios, a melhora no IDEB tem caminhado lado a lado com a diminuição da desigualdade racial. Entretanto, há exceções que alertam para a necessidade de um olhar mais profundo sobre esses dados. Entender o que está acontecendo requer um esforço conjunto entre pesquisadores, gestores e a sociedade civil.
As Tendências Identificadas nos Estados

Um primeiro estudo analisou a relação entre desigualdade racial e o desempenho escolar em nível estadual. O que se observou foi que em alguns Estados a redução da desigualdade racial claramente se relaciona ao aumento do rendimento do IDEB. A interpretação desta análise preliminar nos permite ver associação entre a diminuição de desigualdade e alguns Estados. Isso não quer dizer que sabemos, somente com essa análise, qual a relação de causa e efeito, mas ainda assim, é uma conquista para um futuro mais justo saber que é possível aumentar a qualidade do ensino somada à diminuição da desigualdade racial.
O destaque foi para Estados do Nordeste, como Alagoas, Ceará e Pernambuco, e no Norte, Roraima, que se observar onde há maior redução da desigualdade racial, o avanço do IDEB foi mais expressivo (Estados em amarelo no mapa). Por outro lado, alguns Estados mostraram uma relação mais fraca ou até mesmo um aumento na desigualdade racial ao longo dos anos (Estados em azul escuro no mapa). Nessas regiões, o crescimento do IDEB pode ter beneficiado mais certos grupos do que outros, ampliando diferenças históricas no acesso à educação de qualidade.
Os Municípios com Maior IDEB e a Variação na Desigualdade Racial

Ao observar os 50 municípios com os maiores IDEB do país, os dados reforçam que a maioria das cidades que mais avançaram no desempenho escolar também reduziram a desigualdade racial. Municípios como Ibateguara (AL), União dos Palmares (AL) e São José da Laje (AL) tiveram as maiores reduções na desigualdade racial entre 2019 e 2023, com índices de diminuição relativa superiores a 50% entre os anos comparados.
O que esses dados significam?
Os resultados iniciais apontam para um cenário promissor, mas que exige cautela. Observa-se que a redução da desigualdade racial está associada a um crescimento mais sólido do IDEB em diversas localidades, reforçando a importância de políticas educacionais que garantam acesso equitativo ao aprendizado.
Destaca-se o caso do Estado de Alagoas, que vem registrando avanços expressivos ao conciliar a elevação do IDEB com a diminuição das desigualdades raciais. Iniciativas inovadoras – como os programas de busca ativa, criação de novas escolas, acolhimento socioemocional e investimento em recuperação de aprendizagens – têm sido fundamentais para esses resultados.
Em relatório ainda de 2021 do Todos Pela Educação sobre o caso de Coruripe serve de base para refletirmos sobre medidas que demonstram a possibilidade de mudanças com impacto real na gestão educacional.
Segundo esse estudo, a gestão de Coruripe é sustentada por cinco premissas fundamentais: 1) a aprendizagem dos estudantes como um compromisso compartilhado entre todos os atores educacionais; 2) a continuidade da equipe técnica da Secretaria, que garante a permanência das políticas; 3) a construção de uma visão sistêmica, em que diversas ações interligadas colaboram para elevar a qualidade do ensino; 4) a abertura para parcerias e aportes externos que potencializam as iniciativas locais; 5) e a inserção da educação em um contexto colaborativo, com a articulação entre Coruripe, municípios vizinhos e o programa “Escola 10” do Governo Estadual.
Além disso, o documento ressalta quatro elementos centrais das políticas adotadas: 1) a garantia de que os alunos estejam presentes e em condições adequadas de aprendizado, enfatizando a prevenção do abandono escolar; 2) a implementação de uma gestão pedagógica coerente, que oferece suporte por meio de currículo, materiais, avaliação e formação continuada; 3) a reorganização da rede de ensino para assegurar melhores condições de ensino-aprendizagem, especialmente com investimentos que igualem o acesso entre alunos das zonas rurais e urbanas; 4) e o monitoramento e acompanhamento pedagógico constante pela Secretaria, com metas bem definidas e o uso de dados padronizados. Essas diretrizes demonstram que, com uma gestão integrada e políticas bem estruturadas, é possível efetuar mudanças significativas na educação.
A importância do esforço coletivo
A análise dos dados do IDEB e do VAAR do FUNDEB evidencia a necessidade de cautela e aprofundamento, mostrando que a redução das desigualdades pode – ou não – acompanhar a melhoria do desempenho escolar. O caso de Alagoas demonstra que, com políticas públicas bem direcionadas, é possível avançar significativamente na qualidade da educação enquanto se reduz as disparidades raciais.
De maneira similar, a experiência de Coruripe, conforme apontado pelo documento do Todos Pela Educação, ilustra como uma gestão fundamentada em premissas sólidas e elementos estruturais bem definidos pode transformar o cenário educacional. Essa abordagem integrada – que abrange desde a centralidade da aprendizagem até a implementação de parcerias e o monitoramento contínuo – destaca a importância de um esforço coletivo entre governo, sociedade e academia. No entanto, é preciso atualizar o que sabemos sobre as iniciativas para melhorias na aprendizagem que estejam associadas a diminuição nas desigualdades estruturais vivenciadas por nossos estudantes.
Embora os dados apresentados sejam análises preliminares e exijam estudos mais aprofundados, dar visibilidade à redução da desigualdade racial é um passo indispensável para assegurar que o progresso no IDEB se traduza em uma educação mais justa e igualitária para todos.